Relatório de visitas feitas por Carlos Gussoni, Jeremy Minns, Luiz Fernando Figueiredo e Ricardo Campos.

Visitamos o Núcleo Curucutu em 17 de março e em 7 e 8 de setembro de 2002. A sede do Núcleo fica próxima do limite sul do município de São Paulo, nas coordenadas 23º59'S, 46º44'W. Tem aproximadamente 26.542,65 ha de extensão, distribuídos nos municípios de São Paulo (5.506,97 ha), Itanhaém (21.094,46 ha) e Juquitiba (2.941,22 ha). O nome, de origem indígena, refere-se a uma coruja, possivelmente a mesma que hoje chamamos de jucurutu, Bubo virginianus. Grande parte da área do Núcleo, no planalto, foi desmatada no passado, para a produção de carvão. Andando pela área encontra-se diversos fornos de carvão, vimos um que estava ainda perfeitamente intacto. Muitas áreas de matas são portanto secundárias. Há também áreas com Pinus elliotti, remanescentes de antigas plantações. Segundo o Diretor do Núcleo, Maurício, estes Pinus poderão ser retirados para aproveitamento de madeira, de modo que no futuro é esperado que sejam completamente erradicados da área. Um problema que eles têm apresentado é o fato de invadirem o campo. Uns poucos foram derrubados mas seria muito interessante um trabalho mais exaustivo visando a eliminação destes invasores.  Uma paisagem característica é a dos campos nebulares, assim chamados por terem a influência direta e frequente da neblina formada pela ascensão do ar pela Serra do Mar. Estes campos têm como vegetação predominante uma gramínea, diferente das que conhecíamos.

Caminho por uma das trilhas. À esquerda um Pinus invasor.

Ao longe a neblina sobre a montanha.

 

Vistas panorâmicas do campo e matas ciliares.

 

 

 

 Segundo um morador local, esta gramínea  não é comida pelo gado, de modo que estas áreas nunca se prestaram como pastagens. Também é comum nestes campos a carqueja e Sphagnum. Há arbustos esparsos, mas que não têm aquela característica retorcida e xerófita das plantas do cerrado. A possível influência antrópica na formação destes campos ainda não foi totalmente afastada e este é um dos aspectos que estão sendo tratados na tese de Doutorado do Maurício, que é Engenheiro Florestal. nos grotões entre os morros crescem matas ciliares. Segundo ele nos confirmou, estes campos têm elementos típicos da flora andina, o que também ocorre com os campos de altitude do sudeste do Brasil. As únicas aves que vimos no campo aberto foram o tico-tico, Zonotrichia capensis, o caminheiro, Anthus lutescens e a Muscipipra vetula.

Sphagnum

 

 

Há grandes capões de matas e estas matas, também chamadas de matas nebulares são muito belas em seu interior, por terem um número considerável de bromélias e orquídeas, dando um aspecto de um jardim cuidadosamente planejado. Chamou nossa atenção a beleza de alguns araçá-piranga, com os troncos avermelhados.

Orquídea do gênero Sophronites.

 

Chama a atenção, à primeira vista, um número muito pequeno de insetos (ficamos de retornar no auge do verão para ver se continua desta forma). Foram muito poucos os que observamos: um pequeno besouro na "orquídea do campo", que parece ter uma relação biológica específica com ela, três espécies de gafanhotos, uma lagarta, uma aranha pequena parecida com a aranha-de-grama, Lycosa, uma libélula e..., parece que só isto! Ah, sim, vimos diversos ninhos de formigas lava-pés, Solenopsis sp (Myrmicinae),  e um outro exuberante da formiga caçadora, Camponotus cf renggeri (Formicinae), um pequeno "morro" de matéria vegetal.

Carlos observando orquídea do gênero Zygopetalum.

Orquídea do gênero Zygopetalum.

 

Quando tivermos uma lista mais completa da avifauna será interessante verificar as guildas, provavelmente insetívoros estritos não levam muita vantagem por aqui. De fato, observamos Notiochelidon cyanoleuca principalmente perto da sede, onde as interferências antrópicas certamente devem aumentar o número de insetos. Também a corruíra, Troglodytes musculus. Ficamos intrigados com o grande número da planta carnívora Drosera em determinadas áreas, geralmente mais úmidas, dos campos. Que insetos será que conseguem capturar. Será que são as formigas?

Drosera

 

Lagarta.

 

Ouvimos a perereca Hyla minuta com grande frequência, vocalizando muito em diversos lugares durante o dia. Nos riachos nas baixadas, no meio das matas ciliares, vimos fezes de anta. Também chama a atenção a ausência de buracos de tatu. Maurício nos disse já ter visto ali o tamanduá-mirim. No lago ao lado da sede, ouvimos e vimos os sapos Bufo ictericus e Bufo crucifer. Em certo momento tivemos a impressão de termos ouvido o rugido de bugios, mas isto não ficou confirmado.

Chama a atenção também, na área, o grande número de bromélias, samambaias e diversas plantas com flores, certamente muitas delas endêmicas ou típicas deste ambiente. 

 

Bromélias em áreas alagadas no campo.

 

Uma Paepalanthus, possivelmente P. bromelioides.

Flor branca.

Orquídea do gênero

 Epidendrum.

Planta típica.

Samambaia.

Samambaia.

 

Fora da área da sede, caminhando-se pelas trilhas que levam ao sul, no sentido da Serra do Mar, nos deparamos com áreas bastante selvagens. Há muitos poucos sinais de qualquer interferência antrópica. O Núcleo é pouco visitado, seja por uma certa dificuldade de acesso, já que para lá chegar devem ser trafegados uns bons quilômetro de estradas e caminhos de terra, seja porque oficialmente o Núcleo está fechado para visitação. Mas os que lá chegam podem visitá-lo naturalmente e da mesma forma são atendidas solicitações de uso da área para pesquisas ou para visitas monitoradas de escolares. Devido ao baixo nível de visitação a área é bastante limpa e é notável também o baixo nível de ruídos externos, mesmo aviões são muito infrequentes, possivelmente vôos particulares, já que a região não parece ser rota de vôos comerciais. Excelente oportunidade para ouvir cantos e gravá-los. Aquele liquem vermelho que dizem ser um bom indicador de qualidade do ar, tem de fato lá um colorido muito forte.

Liquem bioindicador.

 

Cogumelo.

A lista de aves que compilamos na área totaliza 77 espécies. Alguns destaques foram o corocochó, Capornis cucullatus, que o Carlos Gussoni bem lembrou pode ser considerado ali a "voz da paisagem", o Hemitriccus orbitatus, o Phylloscarte difficilis e o Micrastur semitorquatus. Além destas, algumas ainda não foram identificadas, como uma possível Elaenia e duas outras, cujas vozes gravamos.

Esta é a que consideramos ser  uma Elaenia. Será E. obscura?

 

 

 

Criação: 8/3/2003

Atualização: 22/2/2004

Album de Fotos

 

Gilberto Lima, Julio Guedes e Luiz Fernando de Andrade Figueiredo "escaneando" a mata.

 

Carlos Gussoni, Julio Guedes, Luiz Fernando Figueiredo

 e Ricardo Campos, ouvindo vozes do campo nebular.

 

 

Luiz Fernando Figueiredo, contemplando a extensão dos campos nebulares.

 

Gilberto Lima, Carlos Gussoni, Julio Guedes,

Luiz Fernando Figueiredo, Ricardo Campos e Fábio Schunck.