COMO ORGANIZAR UMA ASSOCIAÇÃO ORNITOLÓGICA
Primeiro Passo: congregar os interessados
É surpreendente como podem existir pessoas interessadas em aves que gostariam de relacionar-se com outros com o mesmo interesse mas que simplesmente não o fazem porque não se conhecem. A internet ampliou bastante as possibilidades destas pessoas se conhecerem. Mesmo em localidades com poucos habitantes é possível organizar uma associação. Deve-se partir do princípio de que duas pessoas já constituem uma associação e já podem criar uma estrutura para receber outros interessados.
É indispensável que a organização da associação se dê de forma democrática, para que possa atrair pessoas e ter uma existência duradoura. Nada deve ser pré-estabelecido antes de se fazer contato com todos os possíveis fundadores da associação. Portanto, o primeiro passo é divulgar o mais amplamente possível a idéia da criação da associação, marcando-se uma reunião inicial para que as pessoas se conheçam. A internet, novamente, permite que se façam "reuniões virtuais", ampliando a área de abragência geográfica da associação e permitindo que pessoas com menos disponibilidade de tempo também participem. A divulgação deve incluir, além da internete, notas na Imprensa, cartazes em pontos estratégicos, onde trabalham ou estudam possíveis interessados, como os Departamentos de Zoologia das Faculdades de Biologia, Zoológicos, associações de criadores de aves, Departamentos de Meio Ambiente de órgãos públicos ou privados, associações de amigos de parques e outros. Uma decisão desta primeira reunião já pode ser a de intensificar a procura de pessoas interessadas. Deve-se constituir uma comissão organizadora ou "Diretoria Provisória" já que alguém deverá ficar responsável pelos primeiros encaminhamentos, como avisar as pessoas sobre as próximas reuniões, providenciar local, etc. A criação de um fórum de discussão na Internet será muito útil, isto pode ser feito com facilidade por meio do Yahoo Grupos, Grupos.com ou outros.
Organização institucional
Para que a associação tenha maior credibilidade e mesmo para atender muitas exigências legais é interessante que esteja oficialmente constituída. Para isto deverá ser elaborado o Estatuto e providenciado seu registro em Cartório e a obtenção do CNPJ junto ao órgão da Receita Federal. A entidade poderá também pleitear sua constituição como OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, junto ao Ministério da Justiça, o que a habilitará a celebrar parcerias com os órgãos públicos.
Para a elaboração do Estatuto pode-se aproveitar estatutos de outras entidades semelhantes, fazendo-se as devidas adaptações. Uma ou mais pessoas dentre os futuros associados devem ficar responsáveis pela redação do Estatuto, o qual deverá ser amplamente discutido, item por item, com todos os interessados.
Uma praxe, que foi utilizada pelo CEO e que mostrou-se bastante adequada na prática foi a de incluir no Estatuto apenas questões essenciais, "enxugando-se" ao máximo, omitindo-se todas as questões de menor importância, deixando-as, portanto, para os "casos omissos", a serem resolvidos pelo Presidente, Diretoria, Assembléia Geral. Num primeiro momento poderá parecer que um bom Estatuto é o que contempla todas as coisas, mas na prática isto pode simplesmente sobrecarregar a entidade com exigências criadas para ela própria, "engessando-a" e ocupando-a com atividades burocráticas. As questões "omissas" são resolvidas por meio de Deliberações da Diretoria. É necessário atribuir à Diretoria e a seus membros em particular atribuições que lhes permita tomar determinadas decisões em nome da Entidade sem a necessidade de reuniões ou Assembléias prévias, mesmo que estas decisões exijam um referendum posterior de outras instâncias. Isto dará agilidade administrativa à entidade. Para oficializar a entidade não precisa ter uma sede própria, o endereço da entidade pode ser o endereço residencial do Presidente.
Deve ser garantido no Estatuto a possibilidade de participação de qualquer cidadão. Antes de registrar o Estatuto, é necessário que o mesmo seja bem avaliado e assinado por um advogado, que ajudará a verificar se ele está condizente com todas as exigências legais para que a entidade obtenha seu registro oficial. Para constituir-se como OSCIP há diversas exigências especificas. Mesmo que não se pretenda de imediato ter essa qualificação, é bom já fazer o Estatuto de forma que essa qualificação seja pleiteada futuramente.
Desde a primeira reunião, mesmo as realizadas para os primeiros contatos, devem ser elaboradas Atas registradas em um Livro de Atas, onde constarão um relato resumido da reunião e assinaturas de todos os presentes. A data da primeira reunião, onde os presentes decidem pela criação da entidade, será a data efetiva de sua criação, para fins de comemorações futuras. Oficialmente a data de criação será a de registro da entidade em cartório.
De maneira geral um Estatuto deverá dispor sobre as seguintes questões: nome da entidade e sigla; sede e foro; finalidades e objetivos, se os sócios respondem pelas obrigações da sociedade; quem responde pela entidade; tipos de sócios e sua forma de admissão, saída, direitos e deveres; instâncias deliberativas: assembléia, diretoria, conselho fiscal e a forma de constituição destes; tempo de duração da entidade, forma de modificação dos estatutos; como pode ser dissolvida a entidade e, neste caso, para onde vai o patrimônio. É desejável que constem entre os objetivos da associação o desenvolvimento técnico-científico da ornitologia, a preservação da natureza e a educação ambiental. Deste modo, a associação terá o caráter de uma ONG (Organização não governamental) ambientalista, o que lhe abre alguns espaços maiores de participação na comunidade.
Aprovado o Estatuto na Assembléia Geral de fundação da entidade e feita a eleição da primeira Diretoria, já se poderá providenciar seu registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, quando a entidade passa a ter personalidade jurídica. Normalmente são exigidos para o registro da entidade: cópias do Estatuto, da ata de fundação da entidade, da convocação para a Assembléia Geral de criação da entidade, Relação Qualificada da Diretoria (nome, cargo, estado civil, data de nascimento, endereço, profissão, identidade e CPF), pagamento de taxa.
O próximo passo é a solicitação do CNPJ da entidade junto à Secretaria da Receita Federal, etapa indispensável para que a entidade possa realizar transações financeiras, celebrar contratos, abrir contas bancárias, pleitear recursos junto a órgãos financiadores e mesmo cadastrar-se junto a órgãos oficiais (Secretaria de Meio Ambiente, Conselhos de Meio Ambiente, etc).
Entre as obrigações legais da entidade estão a declaração anual do Imposto de Renda, a declaração da RAIS, etc. Estas devem ser feitas mesmo que a entidade seja sem fins lucrativos e não empregue nenhum funcionário. O ideal é que a entidade contrate um escritório de contabilidade para todas essas providências.
Associados
Os associados variam muito em sua aderência à entidade. Há os que permanecem nela indefinidamente, outros se associam por curiosidade ou por alguma necessidade passageira, perdendo depois de algum tempo o interesse pela Entidade. É desejável estar sempre promovendo a busca de novos associados, para este turnover e ir pouco a pouco ampliando o quadro de associados. Muitas vezes a entidade poderá ser mantida apenas com as contribuições destes.
Reuniões
Quaisquer que sejam seus objetivos, uma boa praxe é a realização de reuniões periódicas. A elaboração de uma agenda com a programação das reuniões, feita e divulgada com uma boa antecedência, é uma boa praxe, para evitar que as pessoas marquem outros compromissos nestes dias.
O estabelecimento de uma pauta prévia para as reuniões e sua adequada divulgação estimula muito o comparecimento das pessoas. O CEO tem como ponto central de suas reuniões uma palestra ou outro tipo de apresentação sobre ornitologia.
O ideal é que as reuniões sejam abertas a todos o interessados, independentemente de serem associados, pois isto favorece a vinda de novos associados.
O local da reunião deve ser de fácil acesso e fácil estacionamento. Em geral será necessário solicitar um espaço emprestado a alguma instituição como Universidade, órgão técnico oficial, escola, outra associação, etc. A utilização de um espaço "público" estimula a participação das pessoas, já que a realização em casas particulares pode inibir os não associados, além da questão da segurança.
Também é importante divulgar as reuniões por meio de informativos, Internet e cartazes encaminhados para pontos estratégicos como faculdades de biologia, instituições técnicas oficiais, outras associações e órgãos de Imprensa.
Sede
A manutenção de uma sede onde funcione o escritório da entidade é fundamental. Neste poderá ficar a biblioteca, arquivos, etc. Um telefone próprio da Entidade ou que possa ser utilizado por esta também é indispensável para favorecer os contatos. Da mesma forma o endereço eletrônico.
Na falta de uma sede própria definitiva, uma Caixa Postal é o ideal para que o endereço não necessite ser mudado. Mudanças de endereço acompanhando mudanças de Diretoria causam confusão, extravio de correspondências e despersonalizam a entidade.
Parcerias e interfaces
Há diversas oportunidades de participação de ONGs científicas e ambientalistas em forums que as congregam, junto aos Conselhos de Meio Ambiente (municipais, estaduais e CONAMA), Secretarias de Meio Ambiente, etc. Estas são boas oportunidades de divulgação, obtenção de recursos, etc. Também a manutenção de um contato com entidades internacionais é fundamental. No caso da ornitologia é recomendável contato com a BirdLife International, uma entidade voltada para a preservação das aves a nível internacional, com sede mundial em Cambridge, Inglaterra, e com organizações ou pessoas que a representam em diversos países. No Brasil é representada pela SAVE Brasil. Da mesma forma contato com outras associações de observadores de aves ou órgãos técnicos da área de ornitologia. Um contato inicial pode ser a simples troca de publicações. Esta é uma boa oportunidade de engajamento da entidade no contexto internacional de preservação das aves. A constituição da entidade como OSCIP a habilita a participar de parcerias com órgãos públicos.
Publicações
É interessante que a associação mantenha algum tipo de publicação, mesmo que seja sob a forma de um boletim onde relate suas atividades, resumos das palestras realizadas, cartas recebidas e artigos sobre ornitologia. O ideal também é que possa ser enviado a todos os interessados, bibliotecas, órgãos técnicos, faculdades de biologia, zoológicos, etc. A experiência da Sociedade Brasileira de Ornitologia, a entidade que congrega os ornitólogos brasileiros, mostrou a grande importância disto, já que foi notado que a interrupção durante alguns anos da publicação de sua revista Ararajuba (hoje Revista Brasileira de Ornitologia) acarretou o afastamento de muitos associados e que o reinício de sua publicação seguiu-se de um significativo aumento na filiação à entidade.
Uma publicação tipo informativo de periodicidade frequente (p. ex. mensal) tem a importante função de manter os associados bem informados sobre a entidade, programações, etc. No CEO notou-se durante certa época que a distribuição do CLIPPING DO CEO, um informativo de periodicidade mensal ou bimensal sobre ornitologia e meio ambiente mostrou-se um fator importante na manutenção da aderência dos associados à entidade. A Internet facilita hoje o envio de Newsletters eletrônicos, sem custos de correio e outros.
Recursos
A arrecadação de contribuições dos associados deve ser feita de preferência sob a forma de anuidades. Desta forma evita-se um trabalho burocrático de arrecadações frequentes (mensalidades ou mesmo semestralidades). Isto é mais importante ainda para os associados de outras cidades, que pagam mediante o envio de cheques ou pagamento em Banco. O valor deve ser acessível. Muitas pessoas podem ficar inibidas de se associarem em função de valores altos, especialmente aqueles que não dispõem de renda própria. Entre estes podem estar jovens que não têm renda própria, estudantes e outros. Pode-se fazer constar no Estatuto cláusulas prevendo isenção de pagamento em alguns casos. Valores diferenciados para estudantes também é uma boa saída. Algumas entidades deixam a critério do próprio associado escolher o valor da contribuição que querem pagar, dentro de um elenco de opções. É importante prever no Estatuto a categoria de associado benemérito ou outra, para pessoas físicas ou jurídicas que se dispuserem a contribuir financeiramente com a entidade.
A procura de apoio financeiro junto a empresas ou órgãos financiadores também é indispensável. As Secretarias de Meio Ambiente poderão informar sobre órgãos financiadores oficiais.
Marketing
A ampla divulgação da entidade é fundamental. A experiência do CEO mostrou que após muitos anos de existência, pessoas que estavam bastante próximas e que teriam interesse em se associar desde o início, ainda desconheciam a entidade. Participar de reportagens em jornais, revistas e televisão é uma excelente forma de divulgação, pois não implica em gastos e atinge um grande número de pessoas. Vale a pena procurar programas de televisão, rádios e jornalistas interessados no assunto.
A entidade deve ter um logotipo.
Outra forma interessante de divulgação é participar com stands da entidade em congressos, encontros, feiras, etc. O encontro nacional anual Avistar é uma ótima oportunidade para isto.
A entidade deve manter um site na internet. Para isto não precisa necessariamente ter o aluguel de um domínio ou provedor, pois há diversos espaços gratuitos que podem ser utilizados.
A entidade deve ter um folheto ou folder sempre disponível e distribuí-lo em eventos, por meio dos associados, etc.
A realização de cursos diversos versando sobre aves é também uma boa estratégia de atrair novos associados ou mesmo angariar fundos. Outra estratégia utilizada é entrar em contato com associações de amigos de parques e outras áreas verdes, clubes, etc, e oferecer para monitorar passeios de observação de aves com os associados destas entidades, bem como realizar palestras sobre este tema.
Excursões e passeios de observação de aves
A realização periódica de saídas para "campo" é de grande importância. Muitos associados confessam que sua expectativa quando se aproximaram da entidade foi basicamente esta. Saídas podem ser feitas em manhãs de fins de semana ou feriados em locais mais próximos ou em finais de semana e feriados prolongados em áreas mais distantes. O CEO elaborou um regulamento para estas excursões, com o objetivo de melhorar a performance do grupo, evitar dispersão ou mesmo atitudes individuais que desagradem aos demais.
Pautas de ação, programas, projetos e campanhas
O estabelecimento de pautas de ação e o desenvolvimento de programas, projetos e campanhas, é importante para dar credibilidade à entidade, além de possibilitar o recebimento de recursos e servir como um elemento aglutinador, fazendo com que todos participem em torno de um objetivo comum. Quando a entidade já tiver uma boa massa crítica de participantes, com potencial para realização de ações diversas, é desejável fazer periodicamente um planejamento estratégico, para o qual há uma metodologia específica.